quinta-feira, 24 de março de 2016

Quando as coisas não acontecem como esperamos


“E disse a mulher: "Acaso eu te pedi um filho, meu senhor? Não te disse para não me dar falsas esperanças?”” II Reis 4:28


Antes de casar tive o privilégio de ser acompanhada por uma mulher sábia e sensata. Em meio as minhas ansiedades e indagações, sentimentos comuns nessa fase da vida, recebi um conselho que levo muito a sério até hoje. Com voz mansa, tia Lu me disse: Não crie expectativas, apenas espere o que Deus tem guardado pra você.
Assim eu me esforcei por fazer, até hoje, não apenas no casamento, mas em todas as áreas da minha vida e percebo como essa postura faz diferença. Costumamos ter expectativas sobre tudo não é?! Estamos jovens e sonhamos com o primeiro emprego; solteiras e ansiamos casar; casadas e esperando o primeiro filho, o segundo, um melhor apartamento e assim vai.  Expectativas a todo momento e ideais de como isso vai encher nossas vidas. Mas como não criar expectativas? De alguma forma elas nos impulsionam, nos fazem seguir em frente. O problema é que o ideal e o real quase sempre estão muito distantes. Existe um “abismo entre pensar e sentir”; entre planejar e realizar.
O marido não é tão romântico, os filhos são mais trabalhosos do que você esperava, o trabalho é chato e pouco compensador, os irmãos da igreja não são tão amorosos e atenciosos.
Não sei você, mas na minha vida poucas coisas saíram conforme o planejado ou de acordo com as minhas expectativas exigentes, perfeccionistas e metódicas, por isso o conselho foi tão sábio e minhas tentativas em cumpri-lo sempre me trazem bons resultados. Quando não nos preocupamos com “como” as coisas serão, podemos aproveitá-las melhor do jeito que são. Curtir as surpresas e driblar os imprevistos.
         A grande questão não é ter ou não ter expectativas, mas como lidar com elas quando são frustradas. Como descansar e esperar o que Deus tem para mim? A  Bíblia nos conta a história da mulher sunamita. Eu amo demais a história dessa mulher. Sou fã! Ela nos ensina e tem tantas aplicações para nossas vidas.
         Se você não lembra bem da narrativa, vou resumir. A sunamita era uma mulher hospitaleira e temente a Deus. Vendo as necessidades do profeta Eliseu resolveu construir um cantinho para ele ficar sempre que passasse pela sua cidade. O homem de Deus percebendo sua generosidade decidiu retribuir -lhe dando o que ainda faltava em sua vida, embora ela tenha dito que não precisava de coisa alguma.
         A sunamita ganhou o maior presente que já havia recebido: um filho. Um dia esse menino já maiorzinho teve uma dor de cabeça e faleceu. A mulher corre, deixa o menino na cama do profeta e segue ao encontro dele para indagar o porquê da falsa esperança, o porquê deu-lhe o gosto da maternidade e depois tirou. Eliseu voltou a cidade, ressuscitou a criança e devolveu-a a mãe. Então, como essa história responde a nossa pergunta? Com os detalhes.
Aquela mulher aprendeu a esperar em Deus. Isso é maior e melhor do que esperar de Deus. “Não mintas (iludas) para tua serva” (II Reis 4:16) , ou seja, ela estava dizendo que não tinha expectativas, que servia ao profeta e a Deus, não pelo que eles tinham para dar. Assim, Deus a surpreendeu. Como é bom se deixar surpreender pelo Pai. Isso só acontece se deixarmos de lado nossas próprias e altas expectativas.
Principalmente quando, fazemos tudo certinho, quando somos obedientes, pensamos, ás vezes, que Deus tem obrigação de fazer do jeito que esperamos. Esse engano nos leva a achar que as coisas são ruins apenas porque são diferentes daquilo que esperamos. Vemos só o ponto preto e esquecemos de todo o restante da folha branca. Essa mulher me dá um tapa na cara quando após a morte do seu filho, em seu momento de desespero afirma: “vai tudo bem” (II Reis 4:26). Ela se recusa a demonstrar sua dor a quem não pode ajudá-la. Apenas aos pés do profeta podemos chorar e sermos verdadeiramente consolados. A mulher sunamita nos ensina o que fazer quando as nossas expectativas são frustradas, quando perdemos, quando tudo falta.
Ponha seus sonhos, planos, ideais, expectativas e esperanças na cama do profeta e feche a porta.  Corra para os pés dele. Lá você vai encontrar abrigo e vida nova.     Aquela mulher tinha aprendido a não gerar altas expectativas, tinha aprendido a viver com o que tinha, a não olhar o que faltava. Com a perda do filho dela, viu todas as esperanças e expectativas ruírem, mas sabia exatamente o que fazer, onde procurar ajuda. Sempre lembro de uma fala de Kung Fu Panda (animação também é cultura). “O passado e o futuro não te pertencem. Tudo o que você tem é o hoje. Não é a toa que se chama presente”!!
         Viva a cada dia o que Deus tem guardado pra você. Confie! Certamente será surpreendente! Certamente tudo irá bem, mesmo que não pareça.


sexta-feira, 18 de março de 2016

Cárcere Privado



“No final da vida você gemerá, com sua carne e seu corpo desgastados” Provérbios 5:11.

         Se já é difícil passar pelo desgaste do corpo no fim da vida, imagine no início dela. Quem tem dor crônica como eu, por qualquer que seja a patologia, sabe bem do que estou falando. Minhas dores começaram aos dois anos. Na verdade, não sei o que é uma vida sem dor. Embora tenha meus bons momentos, a dor é minha companheira incansável. Às vezes me sinto como naqueles filmes onde a protagonista em coma se vê fora do corpo assistindo de camarote. É duro contemplar o desgaste, a impotência, as limitações, o cansaço.
Hoje levantei, como diz meu pai, com a força da mente. As pernas vacilantes e doloridas (aviso: esse adjetivo sofreu eufemismo). A sensação é que você vai cair a qualquer minuto, como uma fruta madura.  Tinha que fazer exames.
Me surpreendo ainda, mesmo depois de 30 anos, com a falta de sincronia entre meu corpo e minha mente. Acordo com várias idéias, pensamentos a mil, vontade de viver, de ganhar o mundo, mas aí, eventualmente, sou lançada na longa jornada de levantar e chegar até o banheiro. Parece que sou duas pessoas. Me sinto em um cárcere privado. Meu corpo me aprisiona, me atrasa, me empurra pra trás.
Tem algo que aprendi durante todos esses anos. Cada pessoa no mundo vive em seu próprio cárcere. Ele pode ser o corpo, a mente, as emoções, as relações, mas cada um de nós tem sua cota. Uma realidade não é melhor ou pior que a outra, é apenas sua, é privado.
Hoje na volta para casa estava tão cansada que não conseguia nem conversar (esse é meu esporte favorito). Algumas lágrimas escorriam pelo meu rosto na tentativa de dizer o indizível. Aí, percebo um carro a minha frente com duas pessoas que acenavam e buzinavam pra todo mundo que passava na rua. E os passantes acenavam de volta e abriam um sorriso maroto como quem pensavam: quem são essas doidas? Diante disso, enxuguei as lágrimas e dei uma boa gargalhada. Era meu momento de liberdade. Nada mudou, continuo presa, mas naquela hora, senti que podia voar.
Que em meio ao seu cárcere, você se sinta livre. Que a dor suma, mesmo que por segundos, nem que pra isso você tenha que esbarrar com as loucas dos acenos.


quarta-feira, 16 de março de 2016

Medo nosso de cada dia

“Porque aquilo que temia me sobreveio; e o que receava me aconteceu" Jó 3:25.

         Tenho pensado muito sobre o medo. Não sou daquelas pessoas que tem medo de coisas. Com exceção do pavor a baratas (até porque elas são seres malignos), não costumo elencar objetos ou seres que me apavorem. Meus receios são internos, subjetivos, não dá pra apontar, nem pegar, mas posso sentir.

Há alguns dias me vejo envolta por pesadelos, meus e de outros que tem sonhado comigo. Em um deles, eu estava presa a uma bomba que explodia antes mesmo do “cara mau” ativar o dispositivo. As pessoas ao redor afirmavam que eu, literalmente, me “mijei de medo” e isso havia ativado a bomba e me explodido antes do tempo. Conclusão final: O medo além de nos escravizar, nos mata antes da hora.

Assim, fiquei pensando sobre esse tema com a intenção de confrontar meus temores para não ser morta por eles. Quem tiver coragem para ver, percebe que o pavor é diário, está escondido e entranhado. Mas é medo de que? Por qual motivo?

Nas palavras da psicanalista Urania Tourinho, “a busca da felicidade acaba por se transformar, apenas, em um esforço para evitar a infelicidade”. Ah, é isso! Temos medo de ser infelizes. O problema é que assim como Jó, de tanto desejar não sermos infelizes, acabamos sendo. Reagimos ao medo antes que a coisa temida aconteça de fato. Sofremos por antecipação até que a bomba explode e nos mata com um golpe duro.

“A infelicidade pode ser experimentada com muita facilidade, pois padecemos permanentemente de três grandes ameaças de sofrimento: nosso próprio corpo, que nos envia sinais de alarme através da dor e da angústia devido a seu inevitável processo de envelhecimento; o mundo externo, que pode nos lançar ataques intensos e destruidores; e, finalmente, o desgosto decorrente de vínculos com os outros seres humanos, que de todos os males é o mais ingrato.” (Urania Tourinho). A questão é que o corpo, o ambiente e as relações são fontes inesgotáveis de prazer e de desgosto ao mesmo tempo e não podemos nos livrar deles.

A Bíblia nos promete uma solução para o medo. É um remédio diário que pouco a pouco faz efeito: revestirmo-nos do amor do nosso Deus. “No amor não há medo; pelo contrário o perfeito amor expulsa o medo, porque o medo supõe castigo. Aquele que tem medo não está aperfeiçoado no amor” I João 4:18Que a cada dia sejamos aperfeiçoados no Amor e tenhamos menos medo.

quinta-feira, 10 de março de 2016

O primeiro dos medos


“E livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão” Hebreus 2:15.

 
O fato é que todos temos medo. Podemos elencar muitos tipos e tamanhos, mas no final, mesmo o menor deles nos lembra do medo primeiro, que é o medo da morte. Freud nos ensinou que somos os únicos seres vivos a termos consciência da morte e que o inconsciente não aceita um não como resposta, por consequência, não aceita bem o fato de que vamos morrer. Deve ser por isso que a ciência investe pesado nas fórmulas da juventude para retardar esse momento ou, pelo menos, nos iludir com essa impressão.  
      
      A grande questão é que por querermos viver uma vida longa e feliz ficamos cada vez mais aterrorizados com a ideia da morte e o problema é que o medo, ele mesmo, nos escraviza em vida. A psicanálise nos lembra que vivenciamos a morte todos os dias. Por isso nosso medo é diário. Não apenas medo da morte de entes queridos ou de nosso próprio fim, mas a morte manifestada em perdas. Medo de perder o viço e beleza da juventude, de perder os sonhos, a sanidade, a esperança. Temos medo até mesmo de ter nossos desejos atendidos e não saber mais para onde ir e pelo que lutar. Perder é morrer um pouco. Se frustrar também.
     
      A Bíblia nos fala de um Deus que se fez pequeno, se fez humano com a finalidade grandiosa de nos oferecer sua morte e também, sua ressurreição. A morte não o venceu. Ele teve medo, mas não se tornou escravo. Na sua vitória nos promete que se não tivermos medo da morte é nela que seremos libertos da escravidão e nela emergiremos em nova vida, eterna, livre e plena. 

Em sua morte e ressurreição ele nos liberta da escravidão do medo. “Qualquer que procurar salvar a sua vida, perdê-la-á, e qualquer que a perder, salvá-la-á” Lucas 17:33. Que morramos todos os dias Sua morte, para vivermos Sua vida. 

quarta-feira, 9 de março de 2016

The Grand Finale

"Quando, porém, vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá" (1 Coríntios 13:10).


          Quando eu era criança costumava ouvir extasiada as histórias bíblicas. Gostava daquelas que tinha um grande final feliz. Apreciava o rei Davi e sua trajetória sofrida até se tornar o maior rei que Israel já teve. Gostava de José que após anos sem entender o motivo de tanto sofrimento em sua vida tornou-se a segunda pessoa depois do faraó e salvou seu povo da morte. Gostava da história de Ester que havia perdido seus pais e passado tantas lutas, mas se tornou a rainha de um império, estando na hora certa e no lugar certo. Essas eram maravilhosas.

          Aos seis anos enquanto já lutava contra uma doença misteriosa, crônica e muito dolorosa essas histórias me acompanhavam junto com o som da voz rouca da minha mãe que dizia: sua história está sendo de dor, mas você verá o grande final que ela terá. Na minha cabeça infante pensava em um final digno de heróis, governantes e de realeza. Hoje com 32 anos já aprendi outras histórias bíblicas. Aquelas que a gente tende a pular porque não tem final feliz e nem muito menos pompa. Os heróis da fé que foram cortados ao meio, anônimos, sem nenhum atrativo ou grandes conquistas humanas. Aqueles que simplesmente creram e perseveraram até o fim.
       
          Hoje com 32 anos continuo lutando contra a mesma doença e um monte de mazelas que ela deixou e em meio a uma cirurgia e outra fico esperando o Grand Finale. Me pego ansiando fechar o ciclo, olhar pra trás e dizer: "por isso que eu tinha que passar por tudo que passei", "foi por isso que Deus permitiu", "para cada dia de vergonha, dupla honra", "só eu poderia, com minha história de vida, fazer isso ou aquilo". Aquela certeza de que tanta dor e luta não foram em vão. Contudo, sou uma pessoa comum. Nunca fiz nada de extraordinário. Sou respeitada em minha família e sirvo com muito amor ao povo de Deus, mas minha voz nunca foi ouvida por multidões, nunca escrevi um livro, nunca fiz nada digno de nota. Proclamei as boas novas por onde passei , levei pessoas aos pés do salvador, recebi bênçãos e tive algumas conquistas, mas e o meu Grand Finale? Sei que os exemplos que dei estão ligados a "fama" e destaque, mas me refiro a mais que isso. Não é que eu queira ser importante, como José, Davi e Ester, bem, talvez eu até queira. Quem não gostaria? Mas é que gostaria de olhar pra trás e entender tudo o que eu vivi, o motivo de tanta dor e sofrimento, de chegar lá naquele lugar especial e dizer: valeu a pena passar por tudo.
       
          Bem, tenho entendido que embora Deus proporcione esse lugar para alguns, para outros, Ele afirma que embora tenham recebido um bom testemunho por meio da fé, "no entanto, nenhum deles recebeu o que havia sido prometido" (Hebreus 11:39, 40). Eles morreram e sofreram sem entender direito. Nós, os gentios, precisávamos vir para que eles fossem por meio de nós aperfeiçoados. Nada de Grand Finale para eles. Nada de honra, de títulos, nada de ver o fruto do seu penoso trabalho. Nada de extraordinário. Nada de sentido e senso de significado. Nada de final feliz. Então, não tenho como adivinhar em qual grupo estou, nem tenho como saber o fim da história, mas hoje entendo, eu sei, que de um jeito ou de outro minha vida e, a sua, terá um Grand Finale.
       
          Um dia teremos novos corpos, novo nome, não haverá dor, nem pranto, o veremos face a face e seremos tal e qual Ele é. Independente do que eu passe aqui nessa terra e de como serão meus dias e o fim deles, nunca poderei desfrutar de um fim melhor do que esse, jamais desejaria ter um final mais feliz.