“Quando ele abriu o sétimo selo,
houve silêncio no céu por cerca de meia hora”. Apocalipse 8.1.
Minha
vida foi marcada por muitas pausas. Períodos na cama, sem poder desenvolver
minhas atividades normais, tudo parado, silêncio. Por esses dias eu estava na
aula de piano e minha professora me chamou atenção para a pausa que apontava na
partitura. Eu a ignorava e ela passava despercebida. Depois da segunda
repreensão ela me olhou com aqueles olhos que só as professoras de piano tem (ela
é um amor! Melhor professora ever!), e disse com toda naturalidade: “Ana, pausa
também é música”. Quase não consegui mais tocar. Fiquei pensando na realidade
disso e como isso vai para além do âmbito musical. Pausa faz parte da vida,
porque a vida é feita de ciclos e cada um deles tem os momentos de espera e
confusão, períodos de não sabermos qual o próximo passo.
O
problema é que somos seres controladores por natureza, ninguém escapa. Ficamos
tentando antever, estar um passo à frente, ignorar as pausas. Aí a coisa
complica. Quando as ignoramos, a música perde seu ritmo, fica truncada, mais
feia, mais difícil de ser continuada. Para haver música é necessário haver
silêncio e “No som do silêncio, a essência de todos os inaudíveis sons” (Ruy Barrozo) emerge.
É
assim na nossa jornada com Deus também. Muitas vezes Ele não fala. Quando eu
era adolescente li um livro que nunca esqueci: Por que Deus fica em silêncio
quando mais precisamos dEle, de James Long. Como esse livro marcou minha
relação com Deus! O que Deus está tentando nos dizer quando permanece calado?
“Quando, por qualquer razão, a voz de Deus não parecer clara, podemos encobrir
o silêncio e preencher os espaços vazios para Ele ou podemos prestar atenção
cuidadosamente para o que Ele possa estar tentando nos ensinar através do
silêncio”.
Tenho
percebido que, no silencio, podemos ir para dois lados extremos: assumimos a
liderança da comunicação ou criamos amargura por sua revelação incompleta.
Confesso que já fui para ambos os lados. “Não quer falar comigo, então, também
não quero falar contigo. Corta aqui”. De nada me aproveitou.
Por
causa da minha historia de vida, devo ter lido o livro de Jó dezenas de vezes.
Interessante que ele tem 42 capítulos e Deus só vai falar no finalzinho, no
trigésimo oitavo. Além disso, Ele não responde as indagações de Jó, apenas o
coloca em seu lugar e restaura sua sorte. Um “recolha-se a sua insignificância”
foi emitido junto com um “eu renovo todas as coisas”. Deus tremendo!
“Viver
é tatear um labirinto de questões dolorosas e respostas parciais” (James Long).
Nada mais correto que isso. É fato que muitas vezes não o ouvimos porque
estamos distraídos, porque colocamos palavras em sua boca, porque não
aprendemos a falar a mesma língua. Às vezes não temos ouvidos para ouvir; em
outras ocasiões, ele se cala mesmo e precisamos aguardar. Nessa hora, o que já
sabemos de Deus, o que Ele já nos falou, nos ajuda a superar os momentos de
silêncio, nos quais não temos respostas.
Deus é verbo. Ele fala! Alguns
cientistas afirmam que a menor partícula do universo, o quark, é uma espécie de
vibração sonora e está associada à criação de tudo que existe. Incrível!
Gênesis nos conta que tudo foi criado através da palavra. “E disse Deus: Haja
luz. E houve luz!”. Deus é um ser de linguagem! A questão é que o silêncio faz
parte dela. Assim como não existe dia sem noite, nem alegria sem tristeza,
também não tem como haver palavra, sem o silêncio.
Na verdade, não é fácil suportá-lo. Os
psicanalistas dizem que essa é a prerrogativa de um bom analista, a de saber
ouvir o silêncio. Já tive experiências incríveis com Deus; muito Ele já me
falou, mas, ultimamente, em meio a muitas decisões difíceis a tomar, não o
ouço. Não tenho vivido uma vida de pecado, não deixei de buscá-lo, mas tenho experimentado
dias silenciosos.
Lembro,
contudo, que há muitos anos atrás o Senhor me deu o texto de Apocalipse
(escrito acima) me mostrando que, muitas vezes o silêncio é um prenúncio de
algo extraordinário, do descortinar do ‘novo’ de Deus; uma mudança de ciclo, de
fase. Antes do toque das trombetas, reina o silêncio total.
Diante
do caminho que não vislumbro, das escolhas que não consigo fazer, da angústia
diante do incerto, do desconhecido, oro para Deus falar e, enquanto o Pai não
fala, paro para ouvir o silêncio e, parando para ouvi-lo, espero extrair dele,
som.