quinta-feira, 28 de abril de 2016

A síndrome do irmão mais velho: sobre justiça própria

"O filho mais velho encheu-se de ira, e não quis entrar. Então seu pai saiu e insistiu com ele. Mas ele respondeu ao seu pai: Olha, todos esses anos tenho trabalhado como um escravo ao teu serviço e nunca desobedeci às tuas ordens. Mas tu nunca me deste nem um cabrito para eu festejar com os meus amigos. Mas quando volta para casa este teu filho, que esbanjou os teus bens com as prostitutas, matas o novilho gordo para ele! Disse o pai: Meu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que tenho é teu. Mas nós tínhamos que comemorar e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi achado". Lucas 15:28-32
        
       O texto do filho pródigo é um dos mais conhecidos da Bíblia. Ele é bastante pregado com o objetivo de refletir sobre a graça de Deus, o arrependimento, restauração, dentre outras aplicações. O irmão mais novo, geralmente é o centro das atenções, mas há algum tempo venho pensando na participação especial feita pelo irmão mais velho. Ele não tem muito destaque, aparece no finalzinho da história e sua postura é meio que inesperada. Ele faz beicinho, fica zangado e se sente injustiçado diante da atitude do pai em relação ao filho pródigo. 
     As vezes sentimos, pensamos e fazemos coisas que não nomeamos corretamente. Racionalizamos nosso atos e não damos nomes aos bois. O filho mais velho estava cheio de justiça própria. Ele fazia tudo certo, era obediente e por isso se achava digno de receber mais de seu pai do que seu irmão desobediente. Quantas vezes vi em mim e naqueles ao meu redor essa mesma postura. A menina solteira que se guarda e espera há muito tempo por um marido, fica mal quando a recém convertida, “ex-mundana” encontra seu par. A irmã que casou virgem se sente injustiçada porque não pode ter filhos e vê outras mulheres gerando vida mesmo sem quererem e sem saber direito quem é o pai. O rapaz que serve na igreja e trabalha duro vê outros conquistando o emprego. Muitas vezes não é porque estamos barganhando com Deus, mas porque achamos que fizemos por merecer. A questão é que a graça de Deus não funciona com crédito, nem com débito. É sempre favor imerecido, sempre bondade do pai. Ele não nos dá “certas coisas”, Ele sussurra em nosso ouvido: Tudo o que eu tenho é teu. Eu sou teu tesouro, tua porção e tua herança. 
       A grande verdade é que a única coisa merecida por nós é a morte e o inferno não importa o que façamos ou sejamos. Só a graça nos coloca em outra posição, só ela nos faz ter lugar à mesa do Pai. Que a cada dia deixemos a justiça própria e o engano que nos faz crer que Ele nos deve algo. Não importa o que façamos, ainda seremos devedores. Se tivermos tudo e não tivermos Ele, não teremos nada. Se tivermos nada e o tivermos, então teremos tudo. Essa é a simples verdade do Evangelho que não se propõe a extremismos. De um lado, a libertinagem e de outro a obediência religiosa, atrelada a motivações erradas e que preza mais pelo “reino” do que pelo ‘Rei’. Cuidado! A justiça própria pode ser uma armadilha horrível que nos faz perder o melhor da festa e nos distanciarmos do Pai e de nosso irmãos.


2 comentários:

  1. Nosso senso de justiça é naturalmente refratário ao conceito de graça. Principalmente quando o vilão é o próximo! Só percebemos a importância desta virtude quando pisamos na bola e ansiamos por uma nova oportunidade. Pedro, sempre justiceiro, só entendeu este conceito ao ver o olhar misericordioso de Jesus, após negá-lo. Quem teve um encontro real com Cristo jamais se identificará com o irmão mais velho. A reflexão​ honesta​ sobre o texto ​nos dá​ um bom termômetro para avaliar a autenticidade da nossa fé.

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